O rapper encontrou na música urbana uma forma de lidar com os traumas sombrios
Por Bruno Silva
Foto: Yuri Jezzu |
Cria da Zona Norte do Rio de Janeiro, o rapper Klevis recebeu uma série de comentários homofóbicos após expor um áudio com discurso de ódio e ameaças que sofreu do próprio pai. Ao abordar sobre traumas do passado, o cantor mostrou para os fãs o que teve que conviver durante muito tempo: o preconceito.
No áudio, o pai do artista afirma que é “homofóbico” e que “detesta quem convive com viado”, entre outras palavras mas pesadas.No entanto, a repercussão furou a bolha, alcançando outros públicos, que reforçaram o discurso de ódio presente no vídeo. “Ele não está errado”, dizia um comentário. “Isso é um pai de verdade”, complementou outro.
“Quando estou com as pessoas que me rodeiam, não convivo com esse preconceito. Esperava que as pessoas se identificassem com a minha história, mas vi que ainda existe muita gente ruim no mundo que acabou se identificando com meu pai. Mas, tento não me abalar com isso”, conta.
Klevis traz, em seu mais recente trabalho, uma profunda jornada de superação e busca por reconciliação. Crescendo no Complexo da Maré, ele enfrentou não só os desafios da vida na favela, mas também uma intensa batalha familiar. Abandonado pela mãe biológica, foi acolhido por Janete, esposa de seu pai, que o criou com amor e dedicação, e a quem ele retribuiu cuidando até o último suspiro.
No entanto, os conflitos com seu pai, Jayme, se agravaram após a morte de Janete, que faleceu de câncer em seus braços, como ele conta na faixa “A Dor Vai Passar”. Com o luto, Jayme se tornou uma figura agressiva e preconceituosa, especialmente em relação à sexualidade do filho. O álbum “70x7”, já disponível em todas as plataformas digitais, reflete essa trajetória. A faixa de abertura, “Mateus 18-21”, inclui áudios reais do pai, cheios de ameaças e insultos, retratando uma infância e adolescência marcadas pela dor e homofobia.
A vida de Jayme teve um fim trágico quando foi morto na favela Nova Holanda, após mais de 26 anos na prisão, por conta de tráfico de drogas. Antes de sua morte, expressou arrependimento e o desejo de pedir perdão à família, tema que Klevis explora na faixa-título “70x7”, onde busca, através da música, um caminho para a cura e a reconciliação.
Por meio de sua arte, Klevis convida o público a refletir sobre a dura realidade dos jovens da periferia. “O que me levou a escrever esse álbum foi a necessidade de perdoar situações difíceis, principalmente dentro da minha própria família”, declara o rapper, sem medo de revisitar as feridas causadas pelo pai.
Para complementar o lançamento, Klevis estreou nesta sexta-feira (25) o videoclipe da faixa “Uma Grande Favela”, assinado pelo próprio cantor e o diretor criativo e roteirista Madin. O clipe reforça a narrativa de sua trajetória e as realidades enfrentadas por quem vive nas comunidades cariocas, marcando um momento importante na carreira do artista.
Com letras profundas e uma autenticidade marcada por suas vivências, Klevis se consolida como a voz de muitos que, como ele, lutam para transformar sua realidade e a de suas famílias. Afinal, todos conhecem um “Klevis”, e, infelizmente, também conhecem um “Jayme”.